Estudo da Instituição Fiscal Independente mostra que se as mudanças nas regras da aposentadoria não forem aprovadas já não será possível cumprir o teto dos gastos públicos em 2022 e o governo terá que suspender reajustes de servidores e do salário mínimo
Um dos maiores trunfos políticos do presidente Michel Temer — a aprovação da emenda constitucional que instituiu o teto para o crescimento dos gastos públicos — pode estar comprometido a partir de 2022 se a Reforma da Previdência não for aprovada, avisou a Instituição Fiscal Independente (IFI). Um levantamento feito pela entidade ligada ao Senado Federal e divulgado ontem mostrou que o quadro fiscal é muito mais preocupante do que parece. Mesmo se a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 287/2016, que trata das novas regras de aposentadoria e tramita na Câmara dos Deputados, for aprovada, apenas vai adiar o problema até 2025.
Pelas projeções da IFI, a margem para ajuste nas despesas para a União cumprir o teto ficará negativa em 2025, ou seja, o limite dos gastos será descumprido. Com isso, o governo federal será obrigado a utilizar os gatilhos previstos na emenda constitucional, como suspender reajustes de servidores e não realizar concursos. “Quando atingir o teto, o próprio Legislativo não poderá aprovar nada que implique aumento de gastos. E o governo será obrigado a adotar medidas que evitem o aumento real de despesas, como conter o aumento do salário mínimo”, avisou o economista Felipe Salto, diretor-executivo da IFI.
Pelas contas de Salto e sua equipe da IFI, a margem fiscal passível de corte, neste ano, é de R$ 114 bilhões. Esse dado é a diferença entre as despesas obrigatórias e as discricionárias sujeitas ao teto que está limitado a 7,2% de aumento. A margem fiscal é composta por investimentos e despesas de custeio administrativo. Essa última representa quase metade do montante: R$ 52 bilhões. O restante é dividido em desembolsos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com R$ 31 bilhões, e no Minha Casa Minha Vida, com R$ 8 bilhões. Outros investimentos somam R$ 23 bilhões.
Sem a reforma previdenciária, a margem fiscal vai encolhendo de forma mais acelerada do que se a PEC 287/2016 for aprovada, conforme o estudo da IFI. Isso ocorre porque o aumento das despesas obrigatórias, como os gastos com pessoal e com a Previdência, tradicionalmente, é acima da inflação, logo eles tendem a consumir uma fatia cada vez maior das despesas totais, reduzindo a margem fiscal que pode ser cortada. Sem o freio da reforma, a margem ficará negativa em 2022. E, com a aprovação da PEC, esse espaço para ajuste ficará positivo por apenas mais dois anos. Assim, em três anos, ou seja, em 2025, o saldo voltará a ser negativo em R$ 6 bilhões. “Isso mostra que a Reforma da Previdência hoje não é suficiente para cumprir o teto amanhã. O governo precisará tomar medidas adicionais, como a revisão de gastos de custeio e das despesas com pessoal”, avisou.
O teto para o aumento das despesas da União, a partir deste ano, é limitado à inflação. Essa medida é considerada positiva pelo mercado para conter o crescimento real dos gastos públicos, como forma de manter o aumento da dívida pública, que, pelas projeções da IFI, ainda não revisadas, chegará a 76,9% do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. Salto compara a emenda do teto a uma rodovia sem limite de velocidade ou sinalização. “As reformas estruturais e as medidas adicionais para conter os gastos serão as placas para tornar essa via segura”, emendou.
Discrepância
Mas o quadro tende a ser pior do que o projetado pela IFI, pois as estimativas não consideram as recentes alterações, feitas no texto da PEC 287/2016, que reduziram em, pelo menos, 24% a economia inicial prevista pelo governo federal, passando de R$ 793 bilhões para R$ 604 bilhões entre 2018 e 2027. A IFI manteve as projeções de crescimento econômico do Produto Interno Bruto (PIB) para 2017, de 0,46%. A previsão, agora, está alinhada com a do governo federal, que revisou, no fim de março, sua estimativa para este ano, de 1,6% para 0,5%.
No entanto, as expectativas para 2018 são distintas entre os dois organismos, evidenciando a discrepância nas projeções de receita do governo, que devem ser novamente frustradas no ano que vem porque a economia ainda vai se recuperar em um ritmo mais lento. O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) prevê deficit primário de até R$ 129 bilhões, o equivalente a 1,9% do PIB. Para a IFI, o rombo será maior, de R$ R$ 163,9 bilhões, ou 1,9% do PIB.
Disputa na comissão mista de orçamento
O líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), decidiu indicar o senador Dário Berger (PMDB-SC) como presidente da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO). A decisão foi tomada após o senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), presidente em exercício da comissão, indicar o deputado Cacá Leão (PP-BA) como relator-geral da Lei Orçamentária Anual de 2018 sem que haja acordo para a escolha dos integrantes da comissão. “O regimento interno diz que o mais idoso pode convocar a reunião apenas para realizar a eleição, mas ele não pode indicar o relator. É muita presunção”, afirmou Renan. O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendeu que o acordo seja firmado para evitar que a CMO trabalhe sob disputa. “Isso vai inviabilizar a comissão de orçamento o ano inteiro”, ponderou. Desde 28 de março, quando foi instalada, cerca de seis sessões foram suspensas pela falta de acordo. Pelas regras da CMO, a presidência do colegiado, neste ano, deverá ser exercida por um senador do PMDB. Valadares convocou nova sessão para hoje.
(Rosana Hessel)