Jornal do Senado - 05/10/2017
Comissão aprova regras para demitir servidor por desempenho insuficiente
Proposta, que ainda passará por três comissões, vale para servidores estáveis dos três Poderes, nas administrações federal, estaduais e municipais
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) aprovou ontem regras para a demissão de servidor público estável por insuficiência de desempenho, aplicáveis a todos os Poderes, nos níveis federal, estadual e municipal. A regulamentação tem por base o substitutivo apresentado pelo relator, senador Lasier Martins (PSD-RS), ao projeto de lei (PLS 116/2017 – Complementar) da senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE). A matéria ainda passará por três comissões, a começar pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS). Um debate de quase duas horas antecedeu a votação, encerrada com nove votos favoráveis à proposta e quatro contrários.
Rendimento
Pelo texto, o desempenho funcional dos servidores deverá ser apurado anualmente por uma comissão avaliadora e levará em conta, entre outros fatores, a produtividade e a qualidade do serviço. Deverá ser garantido o direito ao contraditório e à ampla defesa. No texto de Maria do Carmo, a responsabilidade pela avaliação de desempenho seria do chefe imediato de cada servidor. Lasier Martins, no entanto, afirmou que nem sempre o chefe imediato é um servidor estável, mas sim um comissionado sem vínculo efetivo com a administração pública. O relator disse que também pesou na sua decisão o posicionamento de entidades representativas dos servidores, para as quais não seria razoável deixar exclusivamente a cargo da chefia imediata uma avaliação que poderia levar à exoneração de um servidor estável. Segundo ele, foi citado o risco de uma decisão de tamanha gravidade ser determinada “por simpatias ou antipatias no ambiente de trabalho”.
Periodicidade
De acordo com o substitutivo, a apuração do desempenho do funcionalismo deverá ser feita entre 1º de maio de um ano e 30 de abril do ano seguinte. Produtividade e qualidade serão os fatores avaliativos fixos, associados a outros cinco fatores variáveis, escolhidos em função das principais atividades exercidas pelo servidor no período. Estão listados, entre outros, inovação, responsabilidade, capacidade de iniciativa e foco no usuário/cidadão. A ideia é que os fatores de avaliação fixos contribuam com até metade da nota final apurada. Os fatores variáveis deverão corresponder, cada um, a até 10% da nota. A depender da nota final, dentro de uma faixa de zero a dez, o desempenho funcional será conceituado dentro da seguinte escala: superação (S), igual ou superior a oito pontos; atendimento (A), igual ou superior a cinco e inferior a oito pontos; atendimento parcial (P), igual ou superior a três pontos e inferior a cinco pontos; não atendimento (N), inferior a três pontos.
Demissão
A possibilidade de demissão estará configurada, segundo o substitutivo, quando o servidor público estável obtiver conceito N (não atendimento) nas duas últimas avaliações ou não alcançar o conceito P (atendimento parcial) na média tirada nas cinco últimas avaliações. Quem discordar do conceito atribuído ao seu desempenho funcional poderá pedir reconsideração ao setor de recursos humanos dentro de dez dias de sua divulgação. A resposta terá de ser dada no mesmo prazo. Também caberá recurso da decisão que negar, total ou parcialmente, o pedido de reconsideração. Mas essa possibilidade só será aberta ao servidor que tiver recebido conceito P ou N.
O órgão de recursos humanos terá 15 dias, prorrogáveis por igual período, para decidir sobre o recurso. Esgotadas essas etapas, o servidor estável sujeito à demissão ainda terá prazo de 15 dias para apresentar suas alegações finais à autoridade máxima da instituição onde trabalha. O substitutivo deixa claro também que a insuficiência de desempenho relacionada a problemas de saúde e psicossociais poderá levar à demissão, mas apenas se a falta de colaboração do servidor no cumprimento das ações de melhoria de seu desempenho não decorrer exclusivamente dessas circunstâncias.
Carreiras de Estado
De acordo com o texto aprovado, a exoneração por insuficiência de desempenho de servidores vinculados a atividades exclusivas de Estado, como policiais, procuradores de órgãos de representação judicial, defensores públicos e auditores tributários, dependerá de processo administrativo específico, conduzido segundo os ritos do processo administrativo disciplinar.
Emendas
Onze emendas foram apresentadas ao projeto, mas Lasier acatou apenas duas, apresentadas por Humberto Costa (PT-PE), de modo parcial. Uma delas garante prioridade aos servidores avaliados com insuficiência de desempenho nos programas de capacitação e treinamento dos respectivos órgãos. A segunda emenda se refere ao processo de desligamento dos servidores que exercem atividades exclusivas de Estado. Nesse caso, ele adotou a proposta de que a exoneração por insuficiência de desempenho dependa de processo administrativo específico.
Eficiência
Ao defender a proposta, Maria do Carmo disse que seu objetivo não é prejudicar os “servidores públicos dedicados”, “que honram cotidianamente os vencimentos que percebem e são imprescindíveis para o cumprimento das atribuições estatais”. Disse ser necessário levar em conta que, quando não há a perda do cargo de um agente público negligente, sérias consequências derivam dessa omissão. “A sociedade se sente lesada, porquanto desembolsa pesados tributos para o correto funcionamento da máquina pública que, por sua vez, não lhe retorna o investimento em bens e serviços.
Rejeição
O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) apresentou voto em separado pela rejeição do projeto. Segundo ele, a proposta ainda motiva dúvidas tanto técnicas quando a respeito de seus objetivos. — Há dúvidas razoáveis sobre seus fins políticos reais, direcionados, em alguma medida, a favorecer um expurgo arbitrário no serviço público, com vistas à redução do tamanho do Estado, numa perspectiva econômica ortodoxa, arcaica e, sobretudo, autoritária — sustentou Randolfe. Para a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), há o risco de que inúmeras injustiças sejam cometidas com os servidores.
Meritocracia
A senadora Ana Amélia (PP-RS) disse que não associa o projeto ao fim da estabilidade, mas sim, à defesa da meritocracia. Eduardo Braga (PMDB- -AM) defendeu o projeto, mas afirmou que a proposta ainda deve ser aprimorada nas próximas comissões. Armando Monteiro (PTB- -PE) disse que o desempenho do servidor muitas vezes é prejudicado pela falta de condições de trabalho. Mas, segundo ele, isso não é motivo para que não se avalie o desempenho.
— É possível identificar às vezes, em precaríssimas condições materiais, servidores que se superam e dão belos exemplos do seu compromisso. Simone Tebet (PMDB-MS) votou a favor da proposta, mas apontou a possibilidade de vício de constitucionalidade. No caso de leis complementares, que se aplicam a todos os poderes e entes federativos, ela afirmou que só é possível legislar em relação a normas gerais, e não específicas, como faz o projeto.