Considerações iniciais
Procuramos tratar neste breve artigo, sobre as regras constantes na
Constituição Federal e de diversos julgados que abordam a concessão de Aposentadoria Especial aos servidores públicos vinculados ao Regime Próprio de Previdência Social.
Para fundamentarmos estas breves considerações, iniciamos a abordagem sobre as regras gerais aplicáveis ao benefício de Aposentadoria Especial constantes na Lei
8.213/1991, bem como mencionamos as regras específicas constantes no
§ 4º, do artigo
40, da
Constituição Federal, que trata do benefício especial aos servidores do regime próprio.
O tema ao qual nos aventuramos a escrever, além de complexo, é muito debatido em sede doutrinária e jurisprudêncial, além de exigir, por vezes, conhecimento técnico de outras áreas não jurídicas.
Por fim, oportuno esclarecer que não objetivamos com este artigo realizar uma abordagem muito técnica e direcionada para trabalho científico ou peça processual, nosso foco foi o de esclarecer, na medida do possível, de forma simples, as regras de concessão do benefício de aposentadoria especial aos servidores públicos vinculados ao regime próprio.
Aposentadoria Especial no Regime Geral de Previdência Social
Estabelece o artigo
57 da Lei
8.213/91 que o trabalhador tem direito ao benefício de aposentadoria especial se trabalhar por um período de 15, 20 ou 25 anos, desde que tenha trabalhado em condições prejudiciais à sua saúde.
O período de contribuição de 15, 20 ou 25 anos, necessita que seja sob submissão a agentes que prejudiquem a saúde ou a integridade física do segurado, assim, para ter direito a essa espécie de aposentadoria, o segurado precisa provar que o lapso de tempo trabalhado tenha sido realizado durante o exercício de trabalho que o submeta a determinados agentes prejudiciais à sua saúde, tais como: físicos, químicos e biológicos.
Até a edição da Lei
9.032, de 28 de abril de 1995, a concessão do benefício de aposentadoria especial era regulamentado pelos decretos
83.080/1979 e
53.831/64, que previam a concessão do benefício pelo simples fato do segurado pertencer à categoria profissional mencionada nos referidos decretos. Havia uma presunção legal de que todo profissional integrante dessa lista estava exposto a agentes nocivos, permitindo a concessão da aposentadoria especial.
Contudo, após a entrada em vigor da Lei
9.032, de 28 de abril de 1995, passou-se a exigir a demonstração, através de laudo técnico pericial, da exposição habitual e permanente aos fatores de risco, isto é, presunção legal estava extinta, havendo agora a necessidade de comprovação da existência dos agentes nocivos.
Tratando-se do agente agressivo ruído, a partir de interpretação sistemática do Decreto nº
53.831/1964, Decreto nº
83.080/79, Decreto nº
611/92, artigo 181 da Instrução Normativa nº 78/2002 e Decreto
4882/2003, o limite de ruído para reconhecimento da nocividade passou a ser de 80 decibéis até 04/03/1997 e de 85 decibéis a partir de 05/03/1997.
Para os períodos trabalhados a partir de 01/01/2004 passou-se a ser exigido para a prova do exercício de atividade em condições especiais o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, que possui informações de todo o período trabalhado, ainda que exercido anteriormente a 01/01/2004.
Atualmente, não é a profissão ou a categoria profissional que caracteriza o exercício da atividade sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, mas sim a comprovação da exposição permanente, não ocasional e nem intermitente a agente nocivo que esteja acima dos limites de tolerância aceitos.
Apesar das alterações legislativas, todo e qualquer trabalhador que exerceu alguma atividade constante nas listas dos decretos
83.080/1979 e
53.831/64, antes de 28 de abril de 1995, tem direito adquirido de ter o cômputo especial desse período sem a necessidade de apresentar qualquer laudo pericial ou Perfil Profissiográfico Previdenciário, pois qualquer interpretação contrária será tida como violadora do artigo
5º, inciso
XXXVI da
Constituição Federal de 1988.
Infelizmente, de forma arbitrária o INSS cria obstáculos à concessão da Aposentadoria Especial, estabelecendo a aplicação da regra introduzida na nova legislação, mesmos para os trabalhadores que exerceram atividades especiais anterior à 1995.
Necessário preparar e organizar o requerimento administrativo junto ao INSS, a fim de ter o benefício de aposentadoria especial concedido, tomando algumas providências, a saber:
Requerimento do benefício no INSS: ao completar os 25 (vinte e cinco) anos de trabalho o profissional deverá comparecer a Agência da Previdência Social e efetuar o requerimento administrativo solicitando o pagamento do benefício, como forma de resguardar seu direito, pois o benefício é sempre devido a partir do requerimento administrativo;
Documentos exigidos: o segurado deverá reunir e preservar todo o tipo de documento comprobatório do exercício da profissão, tais como: comprovante de pagamento do ISS; os comprovantes de pagamento do INSS são indispensáveis; os comprovantes de pagamento da anuidade ao conselho e sindicato da categoria; documentos comprobatórios dos materiais e agentes manipulados, assim como todos os demais documentos que possuir, inclusive o PPP.
Na hipótese do INSS indeferir o pedido da aposentadoria especial ou a conversão do período comum em especial do trabalho exercido antes de 28 de abril de 1995, o trabalhador deverá providenciar cópia integral do processo de aposentadoria requerido junto ao INSS para que seja proposta ação judicial visando a concessão do benefício por intermédio de medida judicial.
Aposentadoria Especial no Regime Próprio de Previdência Social
O servidor público ocupante de cargo efetivo tem garantido o direito a uma aposentadoria diferenciada, isto é, especial, conforme se observa no
§ 4º, do artigo
40, da
Constituição Federal, vejamos:
Artigo 40 - Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.
(…)
§ 4º - É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores:
I portadores de deficiência;
II que exerçam atividades de risco;
III cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.
Necessário observar que o
§ 12 do artigo
40 da
Constituição Federal, determina que o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.
O regime geral de previdência social é aquele que é administrado pelo INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, que anteriormente era denominado de INPS - Instituto Nacional de Previdência Social.
A Constituição Federal de 1998, garantiu a possibilidade da aposentadoria especial ou diferenciada para o servidor público titular de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídos os servidores das autarquias e fundações desses entes federados, porém, mediante a edição de lei complementar.
Ocorre que, a lei complementar não foi editada até o presente momento, o que tem levado aos servidores públicos que desenvolvem atividade de risco ou sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física (condições insalubres) a, diretamente ou por intermédio de sua entidade de classe, buscar a tutela do Poder Judiciário, para salvaguardar o seu direito a uma aposentadoria diferenciada, ou seja, especial.
Os Tribunais brasileiros, de forma correta e justa, reconhece a aplicação da regra inserida no artigo 57 do Regime Geral para concessão de aposentadoria especial aos servidores vinculados ao Regime Próprio. Oportuno transcrever o julgado do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, vejamos:
Mandado de Injunção - Natureza. Conforme disposto no inciso
LXXI do artigo
5º da
Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada. Mandado de Injunção - Decisão - Balizas. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada. Aposentadoria - Trabalho em Condições Especiais - Prejuízo à Saúde do Servidor - Inexistência de Lei Complementar - Artigo
40,
§ 4º, da
Constituição Federal. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo
57,
§ 1º, da Lei nº
8.213/91. (TRF 3ª R.; AC 343650; Proc. 96030828807; MS; Quinta Turma; Relª Juíza Eva Regina; Julg. 16/09/2002; DJU 06/12/2002; Pág. 589) (Publicado no DVD Magister nº 17 - Repositório Autorizado do STJ nº 60/2006 e do TST nº 31/2007)
Diversas são as decisões que determinam a concessão de aposentadoria especial ao Servidor Público vinculado ao Regime Próprio de Previdência Social.
São várias as profissões que estão enquadradas e aptas a pleitear pelo benefício especial, podemos mencionar a título de exemplo:
Médicos;
Dentistas;
Auxiliares de Enfermagem;
Engenheiros;
Guardas Municipais;
Policiais (civil, militar, federal, rodoviário);
Operadores de Raio-x e Químicos.
As atividades arroladas acima são apenas exemplificativas, pois todos aqueles que trabalham com submissão à agentes nocivos (ruído, calor, fungos, radiação ionizante, frio, eletricidade, combustível, etc), possuem direito ao benefício de aposentadoria especial, mesmo que exista a Lei Complementar regulamentando este benefício aos Servidores Públicos vinculados ao Regime Próprio. Neste passo, transcrevo a decisão abaixo:
Processual civil e administrativo. Servidor Público. Serviço prestado sob o regime da
CLT e da lei nº
8.112/90. Tempo de serviço especial. Período da
CLT. Ilegitimidade passiva da fundação universidade federal de ouro preto. Processo extinto. Tempo de serviço sob o
RJU. Sujeição a condições especiais. Ausência de lei específica. Declaração sob os critérios da lei nº
8.213/91. Mandado de injunção. STF. Cirurgiã Dentista. Decreto n.
83.080/79. Anexo 1.2.8. Horas extras. Incorporação aos proventos. Ausência de autorização legislativa. Pedido parcialmente procedente. Apelação parcialmente provida. Honorários.
(…) A respeito da consideração como especial, de tempo de serviço prestado sob a disciplina da Lei n.
8.112/90, à míngua da Lei específica prevista em seu art. 186, § 2º, o Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida no Mandado de Injunção n. 721-7/DF, DJ de 30.11.2007, admitiu, em face da omissão do legislador, a aplicabilidade do regime de previdência estabelecido pela Lei n.
8.213/91, art.
57,
§ 1º. Em razão desta orientação da Corte Suprema, é autorizada a análise da pretensão deduzida, a propósito da prestação de serviço em condições especiais, sob os critérios disciplinados pela Lei n.
8.213/91, para o período em que a Autora esteve vinculada ao Regime Jurídico Único, qual seja, janeiro de 1.991 a janeiro de 1.996. 3. Acerca da comprovação do exercício de atividade em condições especiais que assegurem o direito à aposentadoria especial, antes da edição da Lei nº
9.032/95, bastava o enquadramento da atividade exercida ou da substância prejudicial à saúde do trabalhador no rol do Decreto nº
53.831/64 ou
83.080/79, sendo dispensável, portanto a apresentação de laudo técnico. Nesse sentido. AC 2000.030273-9/MG. Rel. Des. Catão Alves/Juiz Iran Velasco, convocado. DJU de 29.07.2004, p. 03. 4. A Lei n.
9.032/95, modificando o art.
57 da Lei n.
8.213/91, passou a exigir a comprovação, pelo segurado, do tempo de serviço em atividades nocivas à saúde. Além disso, foi a Lei nº
9.032/95 que acrescentou o parágrafo terceiro ao referido art. 57, introduzindo a exigência do caráter permanente, não ocasional nem intermitente do labor em condições especiais. De se notar que a Lei nº
9.032/95 não determinou a apresentação de laudo pericial para comprovação das atividades desenvolvidas pelo trabalhador. Contudo, a Medida Provisória nº
1.523/96, republicada na MP 1.596/97 e convertida na Lei nº
9.528/97, deu nova redação ao art.
58 da Lei nº
8.213/91. A exigência de laudo pericial, portanto, somente pode se dar a partir de 14.10.96, data da publicação da Medida Provisória nº 1.523/97. 5. Exercia a Autora o cargo de Cirurgiã Dentista. Atividade considerada, por presunção, insalubre à luz do item 1.2.8, do Anexo ao Decreto n.
83.080, de 24 de janeiro de 1.979, destacando o tempo de 25 anos para a aposentadoria especial. Fundamentos que, não obstante inexistir laudo pericial comprobatório da condição insalubre de trabalho, porquanto inexigível pela Lei de Regência do fato ao tempo de sua ocorrência - Janeiro de 1.991 a janeiro de 1.996, autoriza o reconhecimento deste tempo como de natureza especial. 6. Não prospera o pleito recursal para que sejam incorporados aos proventos da Autora, o valor das horas extras prestadas quando em atividade, à míngua de fundamento legal que autorize esta pretensão, aliás sequer demonstrado nas razões de pedir. Precedente. AMS 1998.01.00.048205-2/MT. Rel. Des. Federal Carlos Moreira Alves. DJ de 30.01.2006, p. 15. 7. Processo extinto, sem resolução do mérito quanto à pretensão de conversão, para especial, do tempo de serviço prestado sob o regime da
CLT. Apelação parcialmente apenas para declarar, como de natureza especial, o tempo de serviço prestado pela Autora no período de janeiro de 1.991 a janeiro de 1.996, e determinar a sua conversão para comum, pelo coeficiente de 1,20. Considerando o provimento parcial da apelação, bem como a sucumbência mínima da Apelada, reduzo os honorários de sucumbência já arbitrados pela sentença, para 10%. (TRF 1ª R.; AC 2000.01.00.089355-6; MG; Primeira Turma; Rel. Juiz Fed. Itelmar Raydan Evangelista; Julg. 24/03/2008; DJF1 01/07/2008; Pág. 27).
As decisões acima transcritas deixam claro que o Poder Judiciário reconhece o direito do médico e do dentista, assim como de diversos outros profissionais vinculados ao Regime Próprio de Previdência Social, a contagem especial do período trabalhado antes de 28 de abril de 1995 sem a apresentação de qualquer laudo pericial para isto, pois a Lei
9.032/95 não pode ser aplicada aos fatos ocorridos antes da sua vigência, sob pena de afronta ao direito adquirido.
Portanto, tendo o trabalhador prestado suas atividades antes da Lei nº
9.032/95 tem o direito adquirido a computar esse período como especial para fins de aposentadoria, independentemente de comprovação, aplicando a presunção legal existente na legislação anterior. Para o trabalhador que prestou a sua atividade após a Lei
9.032/95, aplica-se a nova regra, sendo submetido a provar a atividade especial por intermédio de Laudo Pericial.
O servidor público tem direito ao reconhecimento de atividade especial e consequentemente ao benefício de aposentadoria especial, mesmo não existindo legislação específica, uma vez que por força do mandamento constitucional, são aplicadas as regras do Regime Geral (Lei
8.213/91, artigo
57) aos servidores vinculados ao Regime Próprio, inclusive as regras anteriores à vigência da Lei
9.032/95.
Waldemar Ramos Junior
Advogado especialista em Previdência Social
Advogado especializado em Direito Previdenciário, com ênfase no âmbito da Seguridade Social e RGPS...
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