BSPF - 13/01/2013
Não são poucos os representantes da geração Y que estão escolhendo trabalhar para o
governo. Por que isso acontece e o que muda no serviço público
futuramente?
Eles
não são mais reféns do terno e gravata, não carregam pastas e fogem do estigma
da burocracia. A nova leva de servidores públicos brasileiros é formada
essencialmente pelos que transitam na geração Y, grupo de pessoas que nasceram
após a década de 1980.
Apesar
de os dados do Ministério do Planejamento mostrarem que a média de idade dos
servidores ativos do Poder Executivo hoje é de 46 anos, as salas de aula dos
cursos preparatórios para concursos mostram uma nova realidade.
De
acordo com Wilson Granjeiro, professor e dono do Gran Cursos, 65% dos cerca de
30 mil alunos matriculados atualmente são bem jovens. “A grande maioria está
entre a faixa dos 16 e 30 anos. Mesmo quem é menor de 18, idade inicial para
tomar posse, já tenta se preparar. Os jovens estão invertendo o processo,
entrando primeiro na carreira pública e depois se preocupando com a graduação”,
explica.
A
história do velho Barnabé, contada no samba de Haroldo Barbosa e Antonio
Almeida, anda em vias de se tornar lenda no imaginário popular. O servidor
retratado na música, acomodado e pouco preocupado com o trabalho público, não é
mais uma constante em grande parte das repartições públicas do
país.
Em
vez de carregarem papéis e carimbos de um lado para o outro, a nova geração de
funcionários está conectada a tablets e celulares, planejando, gerenciando
crises, esboçando grandes projetos e buscando inovação. E esse grupo tem
desempenhado papéis cada vez mais importantes no governo.
Granjeiro
acredita que o fato de os órgãos governamentais oferecerem remunerações melhores
do que as da iniciativa privada influi muito na hora de os jovens optarem pelos
cargos públicos.
Segundo
ele, no Distrito Federal se paga quatro vezes mais no serviço público do que na
iniciativa privada. “Onde um jovem que acabou o ensino médio pode começar uma
carreira ganhando R$ 14 mil, como é o caso dos técnicos legislativos da Câmara?
Como um jovem que mal terminou o ensino superior ganha R$ 26 mil, como se pode
ganhar nas carreiras de magistratura? Isso pesa muito na hora da escolha”, diz.
Apesar
de os gordos contracheques serem um grande atrativo para os jovens que pretendem
ser concursados, o professor alerta para outros fatores. “Escolher um concurso
apenas pela remuneração e pelo número de vagas é um erro crasso. Deve-se
escolher também por afinidade, pela vocação. Isso ajuda na hora dos estudos, da
aprovação e da progressão na carreira.”
O
professor profetiza que, no prazo de uma geração e meia, o quadro de servidores
públicos do governo federal deve estar tomado pelos membros da tribo Y. “Até lá
devemos ter uma administração pública bem gabaritada, um Brasil totalmente
renovado.
Saímos
de uma cultura burocrática e entramos na era gerencial.” Para ele, a entrada de
jovens nas repartições públicas tem trazido muitas mudanças positivas. O ganho
está no aumento da eficiência, na eliminação do desperdício, no controle dos
gastos, na recuperação de desvios e na criação de receita extratributária.
João
Domingos Batiston Bimbato exemplifica bem isso. Ele tem 27 anos e integra o hall
de diplomatas brasileiros que têm como missão representar o Brasil mundo afora.
A tarefa não é para qualquer um. Para ser aprovado no concurso do Itamaraty, é
necessário ter fluência em duas línguas estrangeiras e ter domínio de
disciplinas como política internacional, economia e direito. Não é à toa: a
remuneração inicial para terceiros secretários, título inicial para quem entra
na diplomacia, é de R$ 12,9 mil.
Para
realizar o sonho de se tornar diplomata, João abriu mão de tudo e se dedicou
apenas aos estudos no período de um ano. “Escolhi a carreira por vocação. Claro
que a questão do salário é importante, mas consegui unir o útil ao agradável. Se
eu tivesse feito o concurso apenas pelo dinheiro, teria optado por outra área,
na qual provavelmente eu ganharia muito mais”, conta.
O
servidor diz ter se acostumado com pessoas jovens no trabalho: “Aqui em
Brasília, essa vontade de ser servidor público é cultural, já vem de casa. A
promessa de estabilidade tem sido fundamental para que os jovens façam essa
escolha”. Ele considera positivo. “Nós estamos sempre conectados às redes
sociais e informados do que acontece no mundo”, acredita.
Com
a mesma idade de João, Anjuli Tostes também tem um bom currículo como
concurseira. Recentemente, passou em 1º lugar no concurso da Controladoria Geral
da União (CGU), para o cargo de analista de finanças e controle, e aguarda a
nomeação.
Antes,
já havia conseguido aprovação nas seleções da Dataprev e do Tribunal Superior do
Trabalho (TSE). Com apenas 27 anos, ela já largou a vida de empreendedora – era
dona de um curso preparatório de concursos – para garantir a estabilidade tão
sonhada por grande parte dos brasileiros. “A iniciativa privada é estimulante e
tem suas vantagens, mas enxerguei no serviço público a possibilidade de
realmente fazer a diferença e ainda de ser bem remunerada por isso”, diz.
O
resultado veio rápido: após estudar oito horas por dia, desde o ano passado,
Anjuli conquistou uma remuneração que ultrapassa a cifra dos R$ 12 mil. Para
ela, a geração Y vai dar cara nova ao setor público: “Nós temos uma profunda
consciência social e vontade de mudar as coisas, de inovar. Somos pessoas cheias
de energia e que gostam de trabalhar a partir de metas, de desafios. Acredito
ser possível mudar a cara do país”.
Com
uma ideia parecida do que é a carreira pública, Maria das Graças Gomes, de
apenas 16 anos, decidiu cedo o que quer fazer profissionalmente. Ela ainda está
cursando o ensino médio, mas pretende, a partir do ano que vem, tomar aulas de
direito para concursos. Sua meta é conseguir uma cadeira no Tribunal de Justiça
do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) ou na Defensoria Pública. “Já fiz o
concurso do Banco do Brasil e percebi que não é tão difícil. Acredito que posso
ser aprovada tranquilamente. Assim que terminar o colégio, vou me matricular em
um cursinho para concursos”, planeja.
Para
Maria, a pressão constante por parte da família e das pessoas mais próximas tem
motivado os jovens a procurar o sucesso profissional nas repartições públicas.
“Você tem que ir para faculdade, ter um bom emprego, ser bem-sucedido. Acho que
é por isso que as pessoas estão procurando cada vez mais fazer concursos”,
relata.
Os
irmãos Rodrigo e Paulo Bessoni, de 26 e 19 anos, compartilham a mesma vontade:
ter bons salários e estabilidade para concretizar desejos e projetos. Ambos
decidiram se tornar servidores por exemplos de dentro da própria família.
Rodrigo
já é concursado: veio de Pernambuco para trabalhar como técnico judiciário do
Superior Tribunal de Justiça (STJ). “Concurso público permite que você tenha uma
renda e se planeje com as outras coisas que deseja fazer. Meu cargo é de nível
médio, mas estou me graduando em economia e pretendo fazer outros concursos para
a área.”
Paulo
pretende seguir os passos do irmão mais velho: “A ideia de estudar para
concursos foi basicamente influência dele. Ele e meu outro irmão são
concursados, minha mãe também”.
Aos
16 anos, participou da primeira seleção. Recentemente, tentou uma cadeira no
Senado e, ao perceber o nível de dificuldade das provas, resolveu continuar
tentando a aprovação.
O
salário, para o jovem, é a maior motivação: “As pessoas precisam se manter
enquanto estudam. O trabalho no serviço público às vezes serve exatamente para
isso. Muita gente trabalha com cinema, por exemplo, e se mantém como servidor.
Na iniciativa privada você fica muito vulnerável”.
Fonte:
Correio Braziliense