MPF manda governo apoiar vítimas do DDT no Acre
Funasa, Ministério da Saúde e Secretaria de Saúde do Acre são
notificados pelo procurador da República.
BRASÍLIA — O governo do Acre e o Ministério da Saúde terão que
oferecer tratamento adequado a servidores e ex-servidores da extinta
Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (Sucam) e da Fundação Nacional de
Saúde (Funasa), contaminados pelo constante manuseio com
dicloro-difenil-tricloroetano (DDT).
Recomendação nesse sentido foi enviada esta semana à Secretaria
de Saúde do Estado do Acre (Sesacre) e ao Ministério da Saúde pelo Ministério
Público Federal no Acre (MPF). As instituições recomendadas deverão se
manifestar sobre os termos da recomendação em 10 dias, sob pena da adoção de
medidas judiciais.
A medida acontece dois meses após a Agência Amazônia
revelar que a contaminação por DDT poderia estar relacionada à morte de 114
funcionários Funasa no Acre, de 1994 até hoje. O último óbito foi registrado no
mês de junho em Rio
Branco. O guarda de endemias aposentado Augustinho Castro e
Silva sofreu uma parada cardíaca, resultado do alto grau de envenenamento no
organismo.
O documento é assinado pelo procurador da República no Acre,
Anselmo Henrique Lopes. Nele, Lopes destaca a necessidade do tratamento porque
os servidores foram expostos a situações de risco por contato com DDT sem o
devido uso de equipamentos de proteção individual. “É com muita satisfação e
sentimento de dever institucional cumprido que recebo essa importante
informação”, disse o presidente de Associação Brasileira de Apoio aos Sujeitos
da Pesquisa Clínica (Abraspec), Jardson Bezerra.
Em maio, a Abraspec denunciou o governo do Acre por uso de cobaias
humanas em pesquisas do mosquito da malária, em Cruzeiro do Sul (AC). O caso
sobre a contaminação pelo DDT veio à tona logo após as denúncias do uso de iscas
humanas na captura de mosquitos causadores da malária. “As pessoas começaram a
acreditar que as mudanças poderiam ocorrer e começaram a nos enviar novas
informações, documentos, provas, denúncias. Agora vemos o resultado prático e
muito positivo”.
Exames e ressarcimento de
gastos - À Funasa,
especificamente, foi recomendado fornecer a todos os seus funcionários e
ex-funcionários do Acre que começaram a trabalhar para a Fundação antes de 1998,
o exame de cromatografia em fase gasosa. Os exames devem ser realizados em, pelo
menos, dois laboratórios de renome nacional.
Lopes recomendou ainda a criação de comissão estadual de
especialistas composta por, no mínimo, um toxicologista, um oncologista, um
neurologista e um médico de trabalho, para efetuar o planejamento, o tratamento
e o acompanhamento médico dos funcionários e ex-funcionários da Funasa no Acre
contaminados pelo DDT. Pelo documento, a Funasa terá também que ressarcir todos
os gastos com exames e tratamentos de saúde realizados pelos servidores
afetados. O ressarcimento inclui os gastos motivados por danos neurológicos,
neoplasias e lesões renais.
Comissão nacional de
estudos - No âmbito do Ministério da Saúde, o procurador
Anselmo Lopes também pede uma ação imediata em favor das vítimas do DDT. Para
isso, ele recomenda a criação de uma comissão nacional de especialistas da área
médica, todos estes notoriamente reconhecidos por seus trabalhos na área
acadêmica, para estudar os efeitos do DDT na saúde humana e propor padrões de
exames e tratamentos aos trabalhadores que, habitualmente, estiveram expostos ao
DDT. A comissão deverá ser composta de, no mínimo, um toxicologista, um
neurologista, um oncologista e um médico do trabalho.
Pela recomendação enviada, à Secretaria de Saúde do Acre caberá
disponibilizar o exame laboratorial de cromatografia em fase gasosa, para a
medição de DDT no meio sanguíneo, bem como todos os demais exames, laboratoriais
ou de imagem, que se demonstrarem necessários, aos funcionários e
ex-funcionários (residentes no Acre) da Funasa, que estiveram expostos ao DDT.
A secretaria terá também que oferecer, como órgão executor do
Sistema Único de Saúde, o tratamento médico adequado aos trabalhadores expostos
sistematicamente ao DDT, na forma determinada pela comissão estadual de
especialistas a ser criada pela Funasa ou na forma solicitada por médico
conveniado ao SUS que seja responsável pelo tratamento do paciente.
As motivações para a
recomendação - Para emitir a recomendação, a Procuradoria da
República no Acre levou em conta além de direitos constitucionais como o direito
à saúde, a preservação da vida, outros dispositivos legais específicos, como a
Lei 8.080/90 que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e
recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes.
Também foram levadas em consideração as denúncias de ocorrência
de graves danos à saúde sofridos por ex-servidores e seus ex-companheiros, em
razão do uso do DDT sem o uso de equipamentos de proteção individual, tendo sido
o DDT banido das práticas agrícolas em 1985, em razão da comprovação dos danos
ambientais potencializados pelo inseticida, e proibido o seu manejo em saúde
pública em 1998.
Outro fato que foi levado em conta é o reconhecimento por parte
da própria Funasa de que, entre 1994 e 2008, 37 ex-funcionários seus morreram no
Acre, sendo 14 deles aposentados e 23 ainda na ativa, por causas diversas,
havendo suspeitas de que várias destas mortes podem ter tido como causa a
exposição ao DDT. Além destas, outras 12 pessoas alegam estar doentes pelos
mesmos motivos.
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