Correio Braziliense - 18/10/2018
Cobrança de aliados fazem Bolsonaro mudar discurso em relação à reforma do sistema previdenciário. Há pouco mais de uma semana, disse que servidores eram os grandes responsáveis pelo rombo. Agora, afirma que o funcionalismo já deu sua cota
O discurso mais ameno do candidato Jair Bolsonaro, do PSL, em relação à reforma da Previdência Social está associado à pressão que ele vem recebendo da bancada da bala e de militares. Policiais civis, militares e federais, além de integrantes das Forças Armadas, têm dito ao presidenciável que não há motivo para tanta pressa em se mudar o sistema de aposentadorias e pensões. Por isso, Bolsonaro, que, de início endossava a posição de seu guru econômico, Paulo Guedes, sobre a necessidade de se fazer logo a reforma da Previdência, agora, passou a dizer que tudo será feito de forma mais moderada. Na visão de Guedes, seria bom se o Congresso aprovasse as mudanças no regime previdenciário ainda no governo Temer.
A disposição de Bolsonaro de não contrariar a bancada da bala e os militares que lhe dão apoio fez com que ele amenizasse o tom em relação aos servidores públicos. Há pouco mais de uma semana, o candidato à Presidência disse que o funcionalismo público era o grande problema da Previdência, “uma fábrica de marajás”. Agora, ele ressalta que os servidores já deram a sua cota de contribuição, pois o sistema do setor público já passou por duas reformas. Pelo projeto de reforma enviado por Temer ao Congresso, o funcionalismo dará uma boa contribuição à redução do rombo na Previdência. Enquanto, no setor público, que atende 1 milhão de pessoas, o buraco anual passa de R$ 80 bilhões, no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), dos trabalhadores do setor privado, são pagos mais de 32 milhões de benefícios, com deficit superior a R$ 180 bilhões.
Para não desanimar os investidores, que apostam na reforma da Previdência, Bolsonaro não descarta, porém, mudanças. “Vamos fazer nossa reforma. Essa que está aí (proposta por Temer), dificilmente será aprovada (pelo Congresso). Não podemos adotar remendo novo em calça velha. Não podemos penalizar quem já tem direito adquirido, o próprio servidor público já sofreu duas reformas previdenciárias. Podemos mexer alguma coisa sim, temos ideias e propostas nesse sentido, mas ninguém será penalizado”, passou a entoar o candidato do PSL.
Onyx nega pressão
Para fontes do mercado, essa mudança no discurso do capitão da reserva é resultado de cobranças da bancada da bala e dos militares. O deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), coordenador da campanha do candidato do PSL e futuro ministro da Casa Civil caso o presidenciável seja eleito, nega qualquer discussão sobre propostas para a Previdência neste momento. “Não estamos discutindo reforma da Previdência agora. Só vamos tratar sobre isso depois de 1º de janeiro de 2019, se vencermos as eleições e assumirmos o governo. No ano que vem, o Brasil vai conhecer a nossa proposta”, resumiu.
Lorenzoni também rechaça a possibilidade ventilada por economistas de que as despesas com assistência social serão retiradas das contas da Previdência. “Temos três propostas em estudo com as equipes de economistas que trabalham com a gente. Tudo está sendo discutido, mas só vamos falar sobre isso em 2019”, acrescentou. Para os especialistas, o risco é de a reforma de Bolsonaro ser mais tímida do que a proposta por Temer. Eles ressaltam ainda que o próximo governo, independentemente de quem vença as eleições, terá de fazer ajustes na Previdência, uma vez que o rombo é crescente e as aposentadorias são uma das despesas que mais pesam no Orçamento da União.
Dúvidas
Contundo, diante do vaivém em declarações e da falta de transparências nas propostas, os analistas estão descrentes. São muitas as dúvidas tanto do lado de Bolsonaro quanto do de Fernando Haddad (PT) para solucionar um buraco perto de R$ 300 bilhões em 2019. O programa de governo do PT não cita uma proposta de reforma da Previdência, o que preocupa analistas. Procurada, a assessoria do partido não retornou até o fechamento desta edição. “Rejeitamos os postulados das reformas neoliberais da Previdência, em que a garantia dos direitos das futuras gerações é apresentada como um interesse oposto aos direitos da classe trabalhadora e do povo mais pobre”, informa texto aprovado pelo diretório do partido em julho.
Haddad, contudo, tem dado declarações favoráveis às mudanças no sistema previdenciário, principalmente no dos servidores públicos. Ele afirmou, recentemente, que iniciará as discussões sobre idade mínima, começando pelas aposentadorias do funcionalismo, que têm custo per capita muito superior ao dos trabalhadores do setor privado. “Nosso foco inicial são os regimes próprios de aposentadoria. Esse contingente de pessoas representa boa parte do problema, e muitos governadores não estão conseguindo sequer pagar os salários dos servidores”, disse.
Desconfiança geral
Na avaliação de Juliana Inhasz, professora de economia do Insper, um dos grandes desafios do próximo governo será mostrar a importância da reforma da Previdência, inevitável para o reequilíbrio das contas públicas e a retomada da confiança dos investidores sobre a capacidade do governo em administrar suas despesas. Para José Luís Oreiro, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), é inadmissível que os candidatos se recusem a tratar desse tema com profundidade nas campanhas eleitorais. Consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados e especialista em Previdência, Leonardo Rolim assegura que a definição de uma idade mínima para aposentadoria é vital para a sustentabilidade do regime previdenciário.
Por Rosana Hessel
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