BSPF - 11/11/2018
Anúncio da pulverização da pasta é rechaçado por representantes dos trabalhadores. Procurador-chefe alerta para precarização de serviços
Rio - O anúncio de que o Ministério do Trabalho vai acabar, feito essa semana pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), recebeu severas críticas de políticos e especialistas. De acordo com personalidades ouvidas pelo DIA, "eventual fusão implicaria na limitação ou falta de autonomia de pasta essencial para que o Brasil supere a crise por seu papel preponderante na geração de emprego e renda". Advertiram ainda que o papel de fiscalização das relações de trabalho, garantia de direitos de trabalhadores, e serviços nos postos da pasta ficarão comprometidos. E defendem que, ao invés de pulverizar ou extinguir a pasta, o governo eleito deveria fortalecer a atuação do órgão.
"Acabar com o Ministério do Trabalho é um retrocesso sem precedentes. Este governo eleito é a continuidade do anterior, e quer fazer com o Trabalho como foi feito com o Ministério da Previdência. Ou seja, desarticulou as políticas sociais e todo o trabalho desenvolvido pela pasta", critica o senador reeleito Paulo Paim (PT-RS). "O fim do ministério vai, inclusive, dificultar a fiscalização para coibir o trabalho escravo", adverte o senador.
"Enxugar a máquina pública às custas do trabalhador é dar poder a um Estado neoliberal, em que o direito ao trabalho cada vez mais se torna desnecessário como proteção ao cidadão e à sua família", alerta José Gozze, presidente da Federação das Entidades dos Servidores Públicos de São Paulo e vice-presidente da Pública Central do Servidor.
"Um governo disposto a mudar a situação do Brasil tem a obrigação de começar exatamente por aqueles que fazem o país crescer, cuidando de seus direitos universais, e aqui, não cabe excluir um dos ministérios mais importantes de proteção ao trabalhador, enquanto outros protegem as grandes corporações", critica Gozze.
Ao que o senador Paim complementa: "Foi este modelo de governo que parte dos brasileiros escolheu. Agora todos terão que arcar com as consequências de um Estado anti-social e privatista, onde os direitos e as conquistas dos trabalhadores não são levados em conta".
"O fim de um Ministério do Trabalho independente é preocupante. Transmite uma mensagem de que o futuro governo não dá a devida importância para as relações de trabalho e seus efeitos", adverte o advogado Jorge Gonzaga Matsumoto, do escritório Bichara Advogados.
Petrus Elesbão, presidente Sindicato dos Servidores do Congresso Nacional (Sindilegis) e Tribunal de Contas da União (TCU), chama atenção para a manutenção de direitos. "Seja qual for a mudança que o Ministério do Trabalho venha a passar, os direitos dos trabalhadores e as boas relações de trabalho não podem ser afetadas. O que esperamos é o fortalecimento e a modernização da instituição, além da desburocratização das leis, e não a redução de seu poder de atuação a uma pasta qualquer. As relações sindicais e de trabalho em longo prazo também não podem ser prejudicadas. Não podemos retroceder quando o assunto é direito dos trabalhadores", afirma.
Serviços dos postos comprometidos
Para o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro, Fabio Goulart Villela, serviços como Vagas de Emprego Sine e Portal Mais Emprego, Sistema de Registro de Empresas de Trabalho Temporário (Sirett); emissão da Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), Seguro-desemprego, e o e-Social ficarão comprometidos, uma vez que serão pulverizados em diferentes órgãos.
"O fim da pasta irá dificultar a fiscalização dos direitos dos trabalhadores, já bastante debilitados pela recente Reforma Trabalhista. Restarão, ainda, prejudicados o combate ao trabalho escravo, ao trabalho infantil e à informalidade, e a fiscalização da segurança e saúde no trabalho. Tudo isso, certamente, trará sérias e graves consequências econômicas e sociais para o país", alerta Fabio Villela.
A questão dos acidentes de trabalho, foram 700 mil só em 2017, e de resgate de trabalhadores em condições análogas à escravidão apontam para a necessidade de fortalecer o ministério e não de acabar com a pasta. O alerta é de Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate) e diretor da Pública Central do Servidor. "É preciso ampliar sua atuação, nunca o seu enfraquecimento. Por isso, rogamos ao governo eleito que encontre uma solução não precarize ainda mais a situação dos trabalhadores brasileiros", diz Marques.
“Desde que foi criado, há 80 anos, o Ministério do Trabalho sempre teve uma importância sem precedentes para a organização, modernização e fiscalização das relações de trabalho, servindo como poder moderador para o equilíbrio entre os interesses empresariais e dos trabalhadores. Assim, em um primeiro momento, a sua possível extinção causa um certo desconforto e é motivo de preocupação para muitos", diz Fabio Chong, do escritório L.O. Baptista Advogados.
Mas ele acredita que a potencial mudança pode não ser de todo ruim. "O alto índice de desemprego que assola o país pode ser visto como um dos fatores que demonstram a inércia que, há anos, atinge o Ministério do Trabalho, que não é capaz de desenvolver políticas e iniciativas que fomentem a criação de novos postos de trabalho", avalia.
'Direitos como produto de mercado'
A similaridade entre a pulverização do Ministério da Previdência e os planos para o Trabalho foi citada por especialistas. "A extinção do Ministério do Trabalho vem na mesma orientação da extinção do Ministério da Previdência. Ou seja torna os direitos do trabalhadores e o servidores um produto de mercado", dispara Márcio Costa, diretor Nacional da Pública Central do Servidor e servidor da Câmara dos Deputados.
Para Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), deixar a pasta a cargo de outras pessoas é cuidar de forma superficial e generalizada: "É o mesmo que ter um especialista em Ortopedia e a medicina acabar com eles e colocar os pacientes no clínico geral. É a mesma coisa? Não."
O fim do ministério pode agravar o cenário de afrontas aos direitos dos trabalhadores, segundo Eder Fernando, presidente do Sindicato dos Servidores da Polícia Federal (SipecPF). “Recebemos a notícia com bastante apreensão. Como sindicalistas, estamos habituados a ver direitos trabalhistas serem desrespeitados e os empregadores buscando brechas na legislação. São práticas que ocorrem até mesmo dentro da Administração Pública", diz.
"Uma nova formatação deve ser construída, ao invés de sua extinção. A recente operação Registro Espúrio, da Polícia Federal, desnudou um fraudulento esquema de concessão de registros sindicais, com altos valores de corrupção. Se esse setor apresenta problemas, pode e deve ser modificado. Mas a totalidade do Ministério do Trabalho, aí incluindo competentes servidores, não pode pagar tão caro pela parte corrupta e apodrecida", afirma Luiz Antonio Baudens, presidente da Fenapef. "Enxergamos o Ministério do Trabalho como um importante fiscal", complementa Eder Fernando.
Por Martha Imenes
Fonte: O Dia
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