Jornal Extra - 18/04/2016
Brasília - O peso dos trabalhadores inativos nos cofres públicos vai além das despesas com a Previdência Social. Dentro do governo, que possui um regime próprio de Previdência para os servidores, os aposentados e pensionistas já ocupam mais da metade do quadro de pessoal em 12 dos 25 ministérios (incluindo Banco Central), segundo dados do Boletim Estatístico de Pessoal do Ministério do Planejamento. As despesas com inativos só no Executivo somaram, em 2015, R$ 91,5 bilhões, 45% de tudo que o governo gasta com a folha de pessoal para esse Poder.
Os casos mais graves são dos ministérios das Comunicações e dos Transportes. Em ambos, 91% do quadro são compostos por aposentados e pensionistas. No Ministério da Integração Nacional, os inativos ocupam 78,6% do total de servidores no órgão. A mesma situação é percebida em outros ministérios: Agricultura (66%), Defesa (74,6%), Desenvolvimento Agrário (53%), Fazenda (56,7%), Planejamento (56%), Previdência Social (56,8%), Saúde (68%) e Trabalho e Emprego (58%). Na maioria desses casos, o grande peso é de quem recebe pensão.
BC: MAIS GASTOS COM INATIVOS
O Banco Central é um caso emblemático. Lá, mesmo sem contar pensionistas, os aposentados são maioria. No fim de 2015, eram 5.166 servidores aposentados, ante 4.187 funcionários da ativa. Somados os pensionistas, 486 pessoas, 57% da folha não exercem funções no banco. A tendência é que a situação piore. Segundo a assessoria de imprensa do BC, 513 pessoas já reúnem condições para se aposentar ou passarão a tê-las em 2016.
A composição do gasto com o quadro de pessoal do Banco Central sofreu uma reviravolta nos últimos dez anos. Em 2005, a despesa com ativos era aproximadamente 60% maior do que a com aposentados e pensionistas. Em 2010, essa proporção passou para 50%. No ano passado, a conta se inverteu: o total gasto com ativos (R$ 1,233 bilhão) foi 5% menor do que os gastos com inativos (R$ 1,306 bilhão).
Na tentativa de evitar o esvaziamento do quadro, o BC estimula a permanência de aposentados na ativa por meio do chamado abono de permanência (um bônus pago a qualquer servidor público federal que, apesar de já possuir condições de se aposentar, permanece no cargo). Segundo o BC, 484 servidores da autoridade monetária recebiam o abono de permanência em abril deste ano.
Após 30 anos como concursado do banco, Marcelo Mazzaro, hoje com 59 anos, se aposentou em 2012. Dois anos depois, voltou para o BC recebendo o abono:
— Quando você se aposenta, o banco dá até cinco anos para o trabalhador voltar, desde que haja interesse também do BC. Eu me ofereci, porque a gente sabe que sempre tem vaga, porque o quadro é antigo.
Ele conta que há uma perda grande do ponto de vista da qualidade da administração pública uma vez que, como não há renovação de pessoal na mesma proporção que ocorrem as aposentadorias, servidores com muita experiência e qualificação não conseguem repassar os conhecimentos para a geração mais nova.
— Há uma perda de qualidade porque os funcionários super qualificados, que viveram vários governos e vários planos econômicos, saem sem poder repassar sua experiência porque não há reposição do quadro. Há muitas mesas vazias no Banco Central.
O último concurso realizado para recompor o quadro do Banco Central foi em 2013. A validade para convocar aprovados nesse certame acabou no ano passado e não há previsão de nova seleção.
MODELO É INSUSTENTÁVEL, DIZ ESPECIALISTA
Segundo o BC, “a situação da folha de pagamentos do Banco Central reflete a evolução do quadro de servidores da Autarquia. A aproximação das despesas com ativos e inativos, portanto, deve-se ao fato de a recomposição do quadro, via concurso público, não haver acompanhado, no mesmo ritmo, as aposentadorias”. Os ministérios do Transporte, das Comunicações e do Planejamento foram procurados mas não responderam até o fechamento dessa edição.
A professora Carmem Migueles, especialista em administração pública da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pondera que a dinâmica de aposentadoria utilizada para servidores precisa ser rediscutida. Para ela, com o envelhecimento populacional, o Estado não terá condições de arcar integralmente com essa despesa:
— A expectativa média de vida vai aumentando, a pessoa tem direito de se aposentar e, segundo a lei, o concursado tem o direito de se aposentar pelo Estado. Essa conta não fecha. Além disso, com o Estado inchado, os recursos dos órgãos para pagar abono de permanência ficam escassos. O ideal seria se aproximar aos poucos do modelo da iniciativa privada, mas quem vai propor uma discussão dessas nesse momento?
(Bárbara Nascimento - O Globo)
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