Canal Aberto Brasil - 20/04/2016
O poder disciplinar da Administração Pública permite que os agentes sejam punidos caso pratiquem infrações funcionais. No exercício desse poder, a Administração recorre às leis nº 8.429/1992 e nº 8.112/1990, ao Decreto nº 1.171/1994, bem como a orientações normativas, portarias, resoluções e outros atos internos. Tais normas têm um objetivo: preservar o interesse público. Os meios para alcançá-lo, no entanto, não podem se sobrepor aos direitos fundamentais. E isso se aplica, inclusive, aos casos em que o servidor se submete às regras administrativas e, eventualmente, a multas exorbitantes e privação de bens.
Desse modo, de acordo com o advogado e professor de Direito Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, é imprescindível que o gestor público, no momento de aplicar a lei, em conjunto com o Poder Judiciário, frequentemente acionado para resolver demandas administrativas, tenha cautela para que não haja interpretação extensiva, principalmente quando se trata de penalidades. “Não significa dizer que atos ilícitos devam ser defendidos ou acobertados, mas que o combate à corrupção deve se traduzir por meio de ações em que se faça presente a prudência e o equilíbrio. Somente assim o interesse público será protegido, e o estado democrático de direito defendido, dentro dos limites da legalidade e sem ofensas aos direitos fundamentais dos cidadãos”, explica.
Lei de Improbidade Administrativa
Tratando especificamente da Lei de Improbidade Administrativa – LIA, é sabido que as definições de atos ímprobos em rol previsto nos arts. 9, 10 e 11 é exemplificativo. Logo, os órgãos de controle frequentemente acionam o Poder Judiciário para denunciar pessoas pela prática de atos ímprobos que violam a LIA. “Por exemplo, a ação de improbidade ajuizada pelo Ministério Público contra policiais que haviam prendido homem em flagrante e praticado tortura para que confessasse o crime. Tal conduta dos policiais é condenável e deve ser reprimida, uma vez que a lei permite que o preso permaneça em silêncio e conte com a presunção da inocência. O caso chegou até o Superior Tribunal de Justiça, que decidiu que a tortura praticada por policial é ato de improbidade administrativa”, ressalta Jacoby Fernandes.
O STJ decidiu que a violência policial arbitrária não é ato apenas contra o particular-vítima, mas sim contra a própria Administração Pública, ferindo suas bases de legitimidade e respeitabilidade. Tanto assim que essas condutas são tipificadas, entre outros estatutos, como o Código Penal e a Lei nº 4.898/65, que trata do abuso de autoridade. Em síntese, atentado à vida e à liberdade individual de particulares, praticado por agentes públicos armados – incluindo tortura e prisão ilegal –, além de repercussões nas esferas penal, civil e disciplinar, pode configurar improbidade administrativa, porque, além de atingir a pessoa-vítima, alcança simultaneamente interesses caros à Administração em geral, às instituições de segurança pública em especial, e ao próprio Estado Democrático de Direito.
“Apesar de todos os fundamentos jurídicos, é necessário ressaltar a preservação da legislação para que não haja um desvirtuamento do fim da Lei de Improbidade Administrativa. São necessárias descrições legislativas menos abertas, que não permitam que o intérprete da lei gere um cenário de injustiça e terror”, conclui Jacoby Fernandes.
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