BSPF - 23/05/2019
Vários segmentos de servidores estão alertando a imprensa, e especialistas em diversas áreas, que é necessário proteger, não os seus interesses, mas os das instituições nas quais trabalham
Há a ideia de que os funcionários públicos se mobilizam para a defesa dos seus interesses, contra reformas que tiram deles salários ou ganhos na aposentadoria. Eles fazem isso.
Mas eles se mobilizam também — e que bom que o fazem — em defesa das suas missões. Atualmente há vários segmentos de servidores alertando a imprensa, e especialistas em diversas áreas, que é necessário proteger, não os seus interesses, mas os das instituições nas quais trabalham. A Funai, a Finep, o IBGE, o BNDES, os auditores fiscais, o Ibama e o ICMbio. Em todos esses órgãos há constrangimentos, de maior ou menor grau, ao trabalho que devem executar.
A MP 870, como foi enviada pelo governo ao Congresso, desmontava a estrutura da Finep e partia ao meio a Funai. A demarcação de terras indígenas ficava com ruralistas. A Comissão Especial criou outro problema: os auditores fiscais foram proibidos de comunicar crimes. Ontem à noite, o Congresso tentava corrigir algumas dessas mudanças.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, atacou o Fundo Amazônia com óbvio interesse de gerir o dinheiro, e por isso fez uma acusação à administração do Fundo, sem apresentar qualquer fato consistente. O problema cresceu porque a direção do BNDES, antes ainda da entrevista do ministro, afastou a então gestora do Fundo Daniela Baccas. Isso provocou a reação forte dos servidores do banco que se aglomeraram no primeiro andar para mostrar sua discordância.
Na Financiadora de Inovação e Pesquisa (Finep), a preocupação é com a transferência das atribuições do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para o Ministério da Ciência e Tecnologia, que esvazia a financiadora de projetos. O curioso é que a Finep responde ao ministério. Essa mudança desmonta o órgão, que tem essa competência desde 1971, e cria a obrigatoriedade de montagem de uma nova estrutura dentro do ministério. Não tem ganho algum, mexendo-se nessa estrutura, apenas cria confusão burocrática. O órgão já está sofrendo com cortes enormes no seu orçamento.
O BNDES vive uma situação inesperada desde o afastamento de Daniela Baccas do Fundo Amazônia, após o ministro Salles fazer uma crítica vaga sobre haver “fragilidades na governança”. Os que financiam o Fundo, os governos da Noruega e da Alemanha, avisaram que estão satisfeitos com a governança. O Fundo Amazônia tem tido enorme relevância no país, como ressaltou a nota da direção do BNDES. Fez coisas como permitir a implantação do Cadastro Ambiental Rural. Setenta por cento dos seus recursos vão para entidades públicas, de estados e municípios.
O BNDES, na nota, disse que qualquer “comissão de averiguação interna” só será instituída se for formalmente notificada pelo MMA. O problema é que ao afastar Baccas o banco fortaleceu o ministro na sua tentativa de pressionar funcionários da instituição. Será um tiro no pé a manobra do ministro Salles de tentar pressionar para assumir o comando do Fundo. Os governos de onde sai o dinheiro podem simplesmente parar de financiar.
No caso do Ibama e do ICMbio o constrangimento imposto pelo ministro Salles é público. Eles já receberam ameaças por não terem comparecido a um evento com os ruralistas para o qual sequer tinham sido convidados. E foi isso que motivou a saída do presidente e da diretoria do ICMbio, que haviam sido nomeados por ele mesmo.
A Funai partida ao meio pela MP 870 vive seu momento de maior fragilidade. O Congresso tentava ontem à noite alterar a mudança feita pelo governo que divide a instituição em duas partes. Uma comandada por uma pessoa que não demonstra ter capacidade de entender a complexidade da questão indígena brasileira, a outra num órgão com óbvio conflito de interesses. O pior é que o ministro da Justiça não demonstra qualquer interesse na volta da Funai ao seu lugar original.
No IBGE, como já escrevi aqui, a grande aflição dos funcionários é com a realização do Censo de 2020. O corpo técnico se sente excluído de decisões para as quais eles estão preparados, até porque é sua função.
Os servidores acompanhavam a discussão de ontem temendo cada decisão. Perdeu-se tempo demais discutindo para onde iria o Coaf. O órgão ficaria bem em qualquer um dos dois ministérios. Acabou, por decisão da Câmara, ficando na Economia. Havia questões mais graves. Uma delas, o que acontecerá com os indígenas brasileiros. Outra é se os servidores conseguirão cumprir suas missões em cada órgão em que atuam e onde têm sido constrangidos.
(O Globo)
Fonte: Condsef/Fenadsef
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