Valor Econômico - 08/09/2016
São Paulo - O partido Solidariedade recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que políticos e servidores públicos possam aderir ao programa de regularização de recursos no exterior não declarados à Receita. Uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) foi proposta na última terça para invalidar o artigo 11 da lei nº 13.254, que trata do veto e estende a proibição aos parentes dessas pessoas.
Para o partido, o dispositivo afronta ao "princípio da isonomia", previsto no artigo 150 da Constituição. No pedido, destaca que o inciso 2 proíbe o tratamento distinto a contribuintes em situações equivalentes e veda a discriminação em razão da profissão. "Este preceito jurídico foi integralmente malferido pelo artigo 11 da Lei nº 13.254", afirma, o processo.
A ação pede o deferimento de medida cautelar monocrática (proferida por um único magistrado e em caráter liminar), o que apressaria a decisão. O prazo para adesão vai até 31 de outubro. Se a decisão for favorável, os políticos terão as mesmas regras aplicadas aos demais contribuintes: pagamento de 15% de Imposto de Renda e de 15% de multa, totalizando 30% do valor regularizado. Em troca, teriam a anistia de crimes relacionados à evasão de divisa.
Advogados dizem que há grande chance de o STF aceitar o pedido. "Poucas vezes vi uma inconstitucionalidade tão flagrante", diz o tributarista José Andrés, sócio do Chediak Advogados. "A vedação da lei, apesar de simpática aos olhos da sociedade - porque mostra que os políticos não votaram em benefício próprio - não tem fundamento na Constituição", disse.
O especialista destaca, por outro lado, que uma reversão na lei acirraria os ânimos na Receita e no Ministério Público. Auditores e procuradores têm se posicionado contra a anistia de crimes relacionados à evasão de divisas, previsto como contrapartida aos contribuintes que regularizem a situação.
Para o tributarista Luiz Gustavo Bichara, do escritório que leva seu nome, será difícil liberar a restrição aos políticos. Já aos servidores e seus parentes, entende ser possível que a norma seja revista. "O conceito da lei é muito amplo, exagerado", diz. Ele cita o exemplo de um professor universitário que tenha recebido valores no exterior, e não pode usar o programa porque a lei o iguala a um político.
O advogado José Yunes, do Advocacia José Yunes e Associados, já previa que a vedação aos detentores de função pública seria questionada no STF. "A exclusão fere os mais comezinhos princípios de direito como o da dignidade da pessoa humana, abrigado na Carta Magna. Bem como fere a norma constitucional quando preceitua que todos são iguais perante a lei."
A inconstitucionalidade da lei também é o principal argumento do advogado Arthur Ferreira Neto, que obteve liminar para permitir a um empresário condenado na primeira instância da Justiça aderir ao programa. Após a suspensão da liminar, o advogado entrou com um pedido de reconsideração e aguarda análise. Enquanto isso, ele estuda o caso de uma pessoa com recursos de origem lícita no exterior, mas que tem um irmão vereador. Apenas pelo parentesco, ele está impedido de usar as benesses do programa e pensa em questionar a vedação na Justiça. Segundo Ferreira Netto, não há suspeita de ato ilícito praticado. "Não há diferença entre uma pessoa comum e quem exerce função comissionada em um cargo público, muito menos quanto a um parente deste."
Políticos e familiares interessados em aderir têm procurado o escritório Dias de Souza Advogados. Da banca, o advogado Thúlio Carvalho chama a atenção para o fato de que, embora o programa seja válido para ativos existentes até 31 de dezembro de 2014, o artigo 11 implica somente os ocupantes de posições públicas em 14 de janeiro deste ano, data da publicação da lei. "Assim, quem deixou de ocupar tais cargos antes dessa data fica livre para se beneficiar da anistia."
(Joice Bacelo e Laura Ignacio)
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