Valor Econômico - 16/06/2017
Brasília - A Medida Provisória 765, que alterou a remuneração de várias categorias de servidores federais, instituindo também o bônus de produtividade para auditores e analistas tributários da Receita, violou vários dispositivos da Constituição, da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), sustenta a nota técnica 102/2017, da Consultoria de Orçamentos, Fiscalização e Controle do Senado. Por isso, a nota diz que o projeto de conversão da MP não estava "em condições de ser legal e constitucionalmente aprovado". No entanto, o projeto foi aprovado pela Câmara e pelo Senado, no início deste mês, e aguarda agora sanção do presidente Michel Temer. A nota técnica foi redigida por solicitação do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES).
O primeiro ponto analisado na nota, assinada pelos consultores José de Ribamar Pereira da Silva e Vinícius Leopoldino do Amaral, é sobre a compatibilidade da MP com os dispositivos do teto de gasto, instituído pela emenda constitucional 95. Um artigo dessa emenda estabelece que qualquer proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro. A MP 765 foi publicada no dia 30 de dezembro de 2016, quando o teto de gasto já estava em vigor. A emenda do teto foi promulgada no dia 15 de dezembro. Os consultores observam que a exposição de motivos da MP 765 informou apenas que haverá um impacto da ordem de R$ 223 milhões em 2016, R$ 3,7 bilhões em 2017, R$ 3,42 bilhões em 2018 e R$ 3,57 bilhões em 2019.
Eles questionam os valores, com o argumento de que são imprecisos, pois parecem fazer referência ao impacto em um exercício em relação ao exercício anterior, mas não ao impacto acumulado. A nota considera que a exigência da emenda constitucional 95 não foi cumprida, pois a informação prestada "está desacompanhada da memória de cálculo, das premissas e da metodologia utilizada para se alcançar os valores demonstrados". A mesma demonstração do impacto orçamentáriofinanceiro é exigida pelo artigo 16 da LRF. A nota diz que não houve essa demonstração e, por isso, os gastos decorrentes da MP "devem ser considerados como não autorizados". Os consultores afirmam ainda que a MP e o projeto de conversão não cumpriram o artigo 17 da LRF, que obriga a proposição legislativa a demonstrar a origem dos recursos que custeará a despesa.
Segundo a nota, a despesa adicional de R$ 223 milhões em 2016 decorrente da MP 765 não estava prevista no anexo 5 da lei orçamentária e, portanto, "a medida provisória não poderia ter sido editada". As dotações que constam do anexo 5 da lei orçamentária de 2017, por sua vez, não são suficientes para cobrir todas as despesas decorrentes da MP 765, de acordo com a nota. Estariam faltando R$ 47,9 milhões. "Nesse caso, como a existência de dotação na lei orçamentária e seu anexo 5 deve ser prévia, haveria afronta direta à Constituição Federal, além do artigo 103 da LDO 2017", diz a nota. A MP teria também, de acordo com os consultores, descumprido dispositivo da Lei de Diretrizes Orçamentárias válida para 2016, que exigiu que a proposição legislativa autorizadora de aumento salarial tivesse iniciado sua tramitação até a data de publicação da própria LDO, o que ocorreu no dia 31 de dezembro de 2015, um ano antes da edição da MP.
A nota técnica concluiu também que a MP 765 autorizou o pagamento retroativo do bônus de eficiência e produtividade aos auditores e analistas da Receita Federal, violando o parágrafo segundo do artigo 98 da LDO válida para 2016. Embora o bônus tenha sido instituído no dia 30 de dezembro de 2016, os servidores receberam o pagamento de R$ 7,5 mil e de R$ 4,5 mil relativo ao mês de dezembro, o que, no entendimento dos consultores, caracterizaria o pagamento retroativo. Por fim, a nota garante que o projeto de conversão da MP 765 violou dispositivo constitucional, pois os parlamentares fizeram emendas ao texto original do presidente da República, que aumentaram despesa, o que é proibido pelo artigo 63 da Constituição. Além de alterar as carreiras de auditor e de analista tributário da Receita, a MP 765 mudou a carreira de auditor do trabalho, as remunerações da carreira de diplomata, oficial de chancelaria, analista de infraestrutura e a carreira de policial civil dos extintos territórios, entre outras.
(Ribamar Oliveira)
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