Greves remuneradas
Correio Braziliense - 12/09/2012
O governo emite sinal contrário a tudo que tinha feito por merecer aplauso da sociedade no tratamento da greve que paralisou por semanas mais de 30 órgãos da administração federal. Prejudicados por não poder contar com os serviços pelos quais pagam ao arcar com pesada carga tributária, milhões de brasileiros acreditaram que nas posições firmes alardeadas pelas autoridades.
Ninguém deixou de reconhecer o direito de reivindicar melhorias salariais, pelo menos nos casos em que as remunerações guardam algum paralelo com o mercado e a vida real, mas a maioria percebeu excessos, tanto nas pretensões de aumento quanto no abusivo alongamento dos prazos das paralisações. Ficou claro, em muitos casos, que, acobertados por uma legislação excessivamente leniente, líderes grevistas passaram a usar a segurança do emprego público para transformar a pressão legítima em constrangimento da autoridade.
Foi com alento que, esgotados os limites da razoabilidade, o cidadão comum, que por muito menos já teria sido posto na rua, ouviu os ministros da Educação, do Planejamento e da Justiça falarem grosso. Apesar do calendário eleitoral, garantiram não abrir mão do desconto dos dias parados. E, no caso das aulas não dadas, seria exigida a reposição integral do semestre letivo.
Ficou a boa impressão de que estavam sendo levados a sério o dinheiro do contribuinte e a gravidade de deixar a população sem atendimento. A Justiça fez sua parte. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou legal o corte do ponto dos funcionários que não compareceram ao trabalho. Ainda ontem, uma liminar que blindava os contracheques dos policiais federais, obtida por sindicalistas do Paraná, foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Ela caiu sob a argumentação de que sua concessão punha em risco a ordem pública, por prejudicar a prestação do serviço de segurança e a ordem administrativa pelo efeito multiplicador da liminar concedida.
Tudo em vão. Como o Correio revelou ontem, o governo simplesmente recuou e decidiu abrir mão de descontar os dias parados. Mandou depositar R$ 13,3 milhões nas contas de 8.932 servidores do Executivo, metade do que havia sido deduzido dos vencimentos dos grevistas no período de 15 de julho a 14 de agosto. A outra metade será paga tão logo os sindicatos apresentem cronogramas de reposições. O Ministério do Planejamento, responsável pela liberação dos pagamentos, garante que, se as reposições não forem cumpridas, os descontos poderão ser retomados. Mas, a esta altura, não será fácil convencer o cidadão de que esse corte será mesmo praticado.
O governo parece ter conseguido estancar o atual movimento grevista. Mas o recuo sinaliza que o preço pago pode ser tão ou mais alto quanto os aumentos negados. Na prática, sinaliza perigoso abalo na credibilidade e na capacidade do gestor de pessoal da administração federal de ser duro nas próximas negociações. Pior: passa a certeza de que vale a pena tirar umas férias fora do tempo, já que nada de mau vai acontecer a quem se absteve de comparecer aos serviço e de atender a seu verdadeiro patrão, o contribuinte.
(Visão do Correio)
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